NÃO

Para satisfazer a curiosidade de uma colega, posto novamente um vídeo da vida passada deste blog.

Jesus, doces e músicas alegres

Mais uma etapa do projeto "Não foi uma bad trip

Jesus, doces e músicas alegres

Uma coleguinha convidou Alice para ir brincar. Ela conhece um lugar legal onde tem uma mesa de pebolim e as pessoas vão brincar.

É sábado. Alice é conduzida pela amiga para uma sala da Igreja Celestial de Jesus Cristo Nosso Senhor Filho de Deus Nosso Pai e Criador. Tem um pessoal lá. Alice é apresentada aos adultos. Eles a cumprimentam de forma amigável. Todos lá se cumprimentam de forma agradável. Pessoas que mal se conhecem agem como se fossem amigos. As pessoas parecem muito felizes mesmo!

Na sede da ICJCNSFDNPC (Igreja Celestial de Jesus Cristo Nosso Senhor Filho de Deus Nosso Pai e Criador) as pessoas são sempre amigas e boazinhas. Alice brinca de pebolim, pega-pega, esconde-esconde... É muito divertido. Durante as brincadeiras eles gritam coisas como “na cabeça do demônio!” e “Aleluia!”, mas Alice não dá muita bola.

Uma das moças sorridentes vai falar com Alice.

— Tu já foi batizada?

— Não.

— Quer ser batizada?

— Tá!

Essa gente é boazinha, qual o problema? A moça leva Alice para uma sala e dá para ela um manto branco. As outras moças chamam as crianças e Alice é guiada pelos corredores.

— Sabe, é muito bom que tu tenha vindo aqui. Quando a gente não é batizada, a gente fica longe de Deus, e fica mais fácil pro Diabo pegar a gente.

Alice já está estranhando esse papo de demônio, mas vai seguindo o jogo. Todos chegam em uma sala com caixas de som, microfones, instrumentos musicais e uma bacia grande. Um homem de terno se aproxima da moça sorridente.

— Então essa garotinha quer abraçar o Senhor?

— Aham...

Ele se abaixa e coloca a mão no ombro de Alice.

— Então minha filha. Tu ama Jesus?

— Ahmm... Sim...

— Rejeita Satanás?

— Aham.

— Quer ser abraçada nos braços reconfortantes de Deus?!

O homem começa a falar mais alto. As pessoas começam a gritar “aleluia” e “irmãos”. Um homem começa a gritar coisas estranhas e se contorcer. O homem de terno continua falando. Alice se diverte com a cena. O homem de terno joga água no rosto de Alice. Ela tenta secar o rosto com as mãos. Mais gritos.

O homem de terno continua falando coisas estranhas. A palavra satã aparece várias vezes, seguida de vaias da platéia. A palavra Jesus também é repetida diversas vezes, geralmente acompanhada por gritos de “aleluia” e mais convulsões do homem que “fala línguas”.

Alice é abraçada pelos presentes e todos voltam para a sala de jogos. Alguns rapazes pegam violões e tocam músicas. Alice canta junto e bate palmas. Até que esse lugar é divertido!

A tarde termina e Alice vai para casa. Na quarta-feira ela vai na casa da amiguinha para o estudo bíblico. Vai ter lanchinho e mais brincadeiras.

Ela chega em casa. Sua mão está lavando pratos. Ela olha com preocupação para a filha.

— Se divertiu?

— Sim.

A semana passa tranquilamente. Chega o dia do estudo bíblico.

Alice vai até a casa da amiguinha e é recebida pela mãe sorridente dela. A gurizada está sentada na sala com as bíblias e os livros didáticos. Alice fica um pouco insegura quando percebe que é a única sem os negócios bíblicos. A amiguinha tranqüiliza ela.

— Hoje tu faz comigo e até semana que vem tu compra o teu.

Eles começam a conversar. O mais velho do grupo começa a falar sobre a lição do dia. Ele fala sobre como agimos no nosso dia-a-dia, sobre como as pessoas ignoram Jesus nos seus corações e sobre como Deus ama a todos, mas as pessoas se afastam dele. Eles lêem alguns trechos da bíblia. Sabe, para um cara que ama todo mundo ele explode bastante gente. A mãe da amiguinha traz suco de laranja e bolo. Um dos rapazes pega um violão e começa a cantar sobre como Jesus é legal. Todos cantam e batem palmas.

Depois do lanche, é para fazer um desenho sobre como Deus é bom. Alice fica enrolando e não faz nada. Alguns olham feio para ela, mas não deixam de estar sorridentes, o que parece um tanto contraditório para Alice.

Sábado tem mais brincadeiras no templo. Alice vai para casa. Os dias transcorrem normalmente.

Chega o sábado. Alice e a amiguinha chegam no templo e vão para a sala de jogos. Mais brincadeiras. Hoje as pessoas sorridentes xingam o demônio mais vezes do que da outra vez. Os rapazes sorridentes continuam tocando músicas sobre como Jesus é legal.

As mulheres sorridentes falam sobre como é importante trazer mais pessoas para perto de Jesus, e pedem para todos tentarem trazer familiares para o templo.

— Alice, e a tua mãe?

— Não, ela é de outra religião.

— Qual?

— Espírita.

A mulher não gosta disso.

— Sabe, tu tem que tomar cuidado para não ficar longe de Jesus. O Diabo ta sempre de olho.

— Hã?

— A Mariazinha brigou com a mãe para estar aqui...

Alice responde, seca e curta:

— Eu não vou brigar com a minha mãe.

A mulher parece triste. As brincadeiras continuam. Alice não se sente mais tão aceita pelo grupo. Ao fim da tarde, ela sai sem confirmar a hora do estudo bíblico.

Sua mãe está sentada na sala.

— E aí?

— Eu não vou mais voltar lá.

Alice não vai brigar com a sua mãe. Nunca. Por nada nesse mundo.